Conto

Capítulo V: a cura

Camila, com as mãos a tremer e totalmente incrédula, mas sem abandonar um sorriso interior leve que lhe chegava ao coração em força, abre o papel. Libertou um enorme esboço de esperança, e levou ao lado mais bonito do nosso corpo, aquele gesto. Onde o mesmo virou abraço em forma de casa. Camila fora transformada, foi feita nova. Ela não estava dentro de si, mas queria arriscar sentir, queria desprender o medo e voar até onde lhe fosse permitido. Era altura de viver, e deixar que, mesmo a vida dela estando aos trambolhões, com pouco a acontecer de verdade, o silêncio lhe dissesse alguma coisa.

Quanto mais pequenos momentos aconteciam entre eles, mais ela queria descobrir aquele ser. O ato de Gonçalo para Camila teve um significado peculiar, nada do género lhe tinha acontecido, e acreditem, ela era o tipo de mulher que valorizava gestos que parecem não trazer nada, mas onde a imensa coisa armazenada neles, é revelador. Este foi o resultado de uma magia indiscutível, que não dava asas a respostas. Há coisas que realmente só são possíveis de acontecer pois estragam-se com respostas que não fazem jus ao que permitem sentir. Camila estava entregue às circunstâncias, estava repleta de corações vibrantes e intensos, estava como nunca esteve, estava perdida num imenso oceano de purpurinas.

Camila andava devagar, ao jeito dela, sem pressas, ia vivendo, ia estando, ia saboreando, e por mais distante que pudesse parecer, ela estava presente, atenta, mesmo que distraída, e tinha sempre um coração de amor a morar-lhe no peito. Ela só queria sinceridade à sua vida, só queria conseguir dizer bem alto – “É isto!”.  E “isto” é incrivelmente profundo quando chega sem pedaços ao coração. E foi. Foi isso. Um pedaço inteiro, um pedaço de um sentimento bonito, fosse ele qual fosse naquelas circunstâncias, fosse até ele um pedaço de um pequeno feijão. Enfim, era alguma coisa. 

“Não estou a saber lidar. Eu sei que sou cética e pouco levada ao amor, mas tenho que admitir que este desenho fez-me sair do meu estado obstinado, e depositar alguma esperança neste Romeu. Mas o que querem que diga?! A sociedade anda um pouco démodé no que respeita ao amor, e eu sou o alerta vermelho de Camila. Ai deste Romeu, chamado Gonçalo, se armar em engraçadinho com ela. Pronto, eu sei, vou tentar ter mais calma, e fazer como vocês. Entrar nesta história de vez. Não vou exagerar nas especulações, e vou esforçar-me para não explodir como até então o tenho feito. Mas … ai dele! Fuiiiiiii.” A voz interior de Camila tem sempre algo a dizer, e eu confesso que já fui mais relutante com ela. Vou-lhe dar mais espaço para se manifestar. Não queremos que morra. Fala tudo, voz do sinal vermelho. E a propósito!! Temos que te dar um nome, esquisitinha, isto de seres “voz interior” já era. 

(a próxima edição continuará a acrescentar confettis de amor a esta história).

Juliana Gomes, escritora
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