Roteiros

Roteiros pelo Património (Terras de Bouro)

O mês de agosto é, por excelência, o mês em que os portugueses aproveitam para descansar, gozando as suas férias depois de um ano de trabalho.

Aliás, há quem ande um ano inteiro a sonhar com o “querido mês de agosto”, com os reencontros familiares, as festas e romarias e as tradicionais idas à praia.

Contudo, com a pandemia que se abateu sobre o mundo, muitas tradições tiveram uma abrupta interrupção e muitas destas coisas boas ficaram suspensas, passando a ser uma memória.

Sem poder participar em ajuntamentos ou estar em locais com grande número de pessoas, há agora que pensar em locais onde se possam gozar as férias com tranquilidade e afastados de locais de provável perigosidade de contágio. E, aqui no Minho, não faltam locais, onde se possa aliar isto mesmo, com conhecimento e património.

Este mês proponho-vos uma caminhada ou um passeio de bicicleta, que pode ser longo, mas reconfortante, pela natureza e pelo património e que, mesmo em dias de calor, pode ser refrescante. Falo-vos de percorrer a famosa Geira, desde do Campo do Gerês até à Portela do Homem.

É consensual entre os historiadores que a Via Nova, popularmente conhecida como Geira, foi inaugurada no ano 80 Depois de Cristo, tratando-se, segundo os especialistas, de uma verdadeira obra de engenharia e arte realizada pelos romanos. Trata-se de uma via que vence montanhas e que, pela sua importância estratégica, foi utilizada até meados do século XX.

A Via Nova terá sido planeada na época dos últimos imperadores da casa de Augusto, sabendo-se, pelas inscrições nos miliários já encontrados, que terá sido inaugurada no ano 80 Depois de Cristo.

Trata-se de uma via que foi muito bem planeada pelos romanos que tiveram um especial cuidado para que não tivesse grande oscilação de quotas numa das regiões mais montanhosas do Noroeste Peninsular. Com serras, que chegam a mais de dois mil metros de altitude, a via não ultrapassa os mil e cem metros no seu ponto mais alto, isto quer dizer que ela foi cuidadosamente planeada para que não tivesse pontos de relevo muito acidentados, o que implicou um trabalho muito apurado.

Para os arqueólogos, a Geira ainda evidencia hoje, «com toda a nitidez, a magnificência de uma obra imperial romana», considerando-a uma «verdadeira obra de engenharia e de arte que nos fala à saciedade do esplendor do Império Romano».

A Geira, devido à sua importância estratégica, foi uma via que, apesar da queda do Império Romano que a construiu, continuou a ser utilizada tanto em termos militares como religiosos e comerciais. Desde a Idade Média até aos nossos dias, o seu traçado continuou a ser percorrido pelas pessoas, tendo sido apenas “ultrapassado” pela chegada do asfalto e das novas vias de comunicação. Pela Via Nova passaram aqueles que estavam encarregues de defender as fronteiras do país, aqueles que peregrinavam até Santiago de Compostela, ou simplesmente por aquelas pessoas que precisavam dela para se deslocar nas suas tarefas que tanto podiam ser agrícolas como comerciais.

 

Um pormenor muito importante quando percorre a Geira é a existência de marcos miliários que vale a pena observar com muita atenção e que tinham uma função muito específica. Eles serviam para marcar as distâncias, para que os utilizadores da Via Nova soubessem, a cada 1480 metros, em que ponto estavam no seu percurso entre Bracara Augusta e Asturica Augusta. O facto de haver mais do que um destes marcos miliários numa determinada milha é que continua por esclarecer e a admirar os investigadores.

E, se muitos miliários chegaram até aos nossos dias, isso deve-se à acção da Igreja que, desde o século XVI, se preocupou em mantê-los e em reerguer os que estavam tombados. Tendo em consideração que os Arcebispos de Braga sempre ostentaram título de Primaz das Hespanhas, estes marcos eram entendidos pela Igreja como «uma afirmação da importância da Arquidiocese de Braga», havendo toda a necessidade de os preservar. A Igreja tirava partido da presença dos miliários que referiam Braga em sítios que já pertenciam a outros bispados, como o de Tui e Ourense. Espero que, em família, ou sozinhos, aproveitem a calma da Geira, com os seus miliários e a imensa fauna e flora do Parque Nacional da Peneda Gerês, e retemperem forças. Boas férias.

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