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«É crucial que haja em Braga mais habitação disponível e mais oferta que as pessoas possam comportar»

O vereador da Habitação da Câmara Municipal de Braga, João Rodrigues faz, em entrevista à Revista Minha, uma avaliação geral do sector da habitação em Braga, e assume que a revisão do PDM é essencial para se alcançar um aumento de terrenos para construção, de forma a responder à enorme procura que se verifica atualmente no concelho.

 

Que avaliação faz ao atual estado do sector da habitação em Braga?

Aquilo que se passa, atualmente, na cidade de Braga vem “a reboque” daquilo que é a realidade nacional, que é o aumento da procura por habitação própria. Em contrapartida, em termos de oferta, não está a existir uma resposta condizente com essa realidade. Em Braga, particularmente, isto verifica-se também devido ao aumento da população, situação comprovada nos números dos últimos Censos. Somos, de longe, a cidade em Portugal, que mais cresceu em termos populacionais nos últimos 10 anos, e há, de facto, cada vez mais gente a procurar a cidade, não só para trabalhar e estudar, como tem sido tradição nos últimos anos, mas também para viver e constituir família.

«A cidade, felizmente, tem crescido muito em termos populacionais. Isto acontece porque Braga é cada vez mais atrativa»

Na sua perspetiva o que urge mudar?

Em termos genéricos, há vários paradigmas que devem ser alterados. No entanto, parece-me que existem dois ou três pontos fundamentais. É essencial que haja mais habitação disponível e mais habitação que as pessoas possam comportar. A oferta existente não pode ser só para pessoas com capacidade aquisitiva, deve também dar respostas para a juventude, para jovens casais e para pessoas mais carenciadas que não têm tanta facilidade de aceder ao mercado. Devemos, contudo, dar espaço ao próprio mercado. Por muito que o setor público tenha um papel essencial nesta matéria, sem o mercado e a iniciativa privada não vamos conseguir dar repostas a esta solução. E para que o mercado possa, efetivamente, empreender e construir mais e melhor – e aqui incluo também a reabilitação – o setor público tem um papel importante, do ponto de vista que são as linhas gerais do ordenamento do território ou na forma de funcionamento dos serviços urbanísticos da Câmara. Resumidamente, o setor público, dentro daquilo que são as suas competências, sem se substituir ao mercado, deve dar respostas a alguns problemas para quem tem menos capacidade aquisitiva e de recorrer ao arrendamento, promovendo, por outro lado, para que a iniciativa privada continue a ter um papel importante e de ser o verdadeiro impulsionador da construção e da reabilitação da habitação em Portugal.

Como define a política de Habitação da Câmara Municipal de Braga?

A Câmara Municipal de Braga tem um histórico notório do ponto de vista da promoção na habitação pública através da BragaHabit e, hoje em dia, todas as autarquias têm de despertar para um novo fenómeno, do ponto de vista da população, que ainda não é totalmente percetível: a atribuição das competências relativas à habitação aos municípios cresceu muito nos últimos anos e, de há uns anos para cá, os municípios têm um papel fundamental nas políticas de habitação. A autarquia de Braga está enquadrada nesse espírito, está atenta à realidade atual e tem dado uma importância muito relevante ao pelouro da habitação. As câmaras municipais, atualmente, têm mais competências e um poder efetivo de alteração da realidade existente, que não tinham há 10 anos atrás, com um novo leque de políticas de habitação e um novo conjunto de programas direcionado às populações com maiores dificuldades de recorrer ao mercado de acesso à habitação. Contudo, este trabalho tem de ser efetuado sempre em parceria com os privados, porque as entidades públicas não têm capacidade para resolver os problemas de forma isolada.

«O PDM tem de ser revisto porque, com a cidade em franco crescimento populacional e desenvolvimento económico, torna-se essencial alcançar também um aumento dos terrenos disponíveis para construção de habitações»

A cidade tem crescido muito nos últimos anos. Quais os motivos para essa realidade?

A cidade, felizmente, tem crescido muito em termos populacionais. Isto acontece porque Braga é uma cidade cada vez mais atrativa. Tem sido efetuada uma política de captação de investimento que tem atraído de forma crescente novas empresas para o concelho. Como consequência, há mais gente a vir trabalhar e viver para cá. A Universidade do Minho tem tido também um papel fundamental. Antigamente, os estudantes terminavam os cursos e procuravam emprego noutras cidades, dada a escassez de trabalho. Hoje em dia, isso não se verifica porque a oferta de emprego, principalmente, qualificada, é elevada e os alunos, facilmente, iniciam a sua vida profissional, depois de terminarem os estudos académicos. Para além disso, há muitos recém-formados noutras universidades de outras cidades que procuram Braga para trabalhar e, consequentemente, viver e formar família. Há, de facto, uma série de fatores que têm atraído pessoas para o concelho. A nós – autarquia – compete-nos, dentro das competências que nos são atribuídas, dar respostas a alguns problemas que surgem desta realidade, de que são exemplo a mobilidade, o aumento dos preços de habitação ou o mercado de arrendamento, que neste momento, não está a dar a resposta perfeita.

«O preço da habitação cresceu em Braga, mas parece-me que nos mantemos ainda muito competitivos, comparativamente a outras capitais de distrito e a outras cidades»

Há perspetivas de uma nova adaptação na revisão do PDM?

Sim. Neste momento, estamos numa fase de revisão do PDM, feita com base numa lei de 2014, efetuada na altura, num contexto diferente do atual. Tínhamos vindo de um período de crise e com todo o país em decréscimo populacional. Ou seja, uma conjuntura completamente oposta àquilo que hoje se passa em Braga. Neste momento, estamos a fazer um PDM com base nessa lei, que está muito focada na reabilitação urbana, mas com a população a crescer e com uma cidade em franco desenvolvimento económico, é, no nosso entender, importante alcançar também um aumento dos terrenos disponíveis para construção de habitações. Tem de existir maior oferta de terrenos tendo em vista a atração e a fixação de muitas famílias nas várias freguesias do concelho. Porque se nada for feito – nos termos da referida legislação – os terrenos urbanizáveis deixam de o ser e vão passar a rústicos, ou seja, o concelho perderá capacidade construtiva. Nós queremos garantir que isso não irá acontecer e tem sido feito um trabalho conjunto, entre a equipa de técnicos municipais do Urbanismo, a CCDR-N (Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte), os presidentes das juntas de freguesia e os proprietários dos terrenos para que se consigam soluções. Este trabalho é efetuado para que se possa continuar a construir em Braga, dando respostas adequadas à procura crescente que se tem verificado em termos de habitação. É fundamental para manter os nossos jovens e famílias, mas também para atrair mais gente para o nosso território.

Braga era até há poucos anos atrás uma das cidades onde era mais barato comprar casa. Continua a ser assim? 

Obviamente que o preço da habitação cresceu em Braga, mas parece-me que nos mantemos ainda muito competitivos, comparativamente a outras capitais de distrito e a outras cidades que se podem equiparar, em termos de número de população ou outras caraterísticas similares a Braga. Os preços, apesar de tudo, não subiram tanto como em algumas cidades, inclusive, com índices de atratividade inferiores. Temos conseguido estancar essa subida meteórica verificada em alguns concelhos e isso deve-se também ao trabalho exímio que tem sido feito nos últimos anos pelos serviços de apreciação Urbanística, através da emissão de licenças de construção nova ou reabilitação. Somos um dos concelhos em Portugal, que mais alvarás tem emitido nos últimos anos. É um trabalho notório e que merece todo o crédito e consideração.

«Temos que ter maior oferta de habitação para que os preços possam baixar» 

Como é possível os preços baixarem novamente para números aceitáveis para a maioria da população?

Tudo aquilo que está a acontecer, resulta de fatores positivos, devido, nomeadamente, ao desenvolvimento da cidade e do concelho. Não sendo tão aceitáveis como há uns anos, ainda são valores toleráveis. Neste momento, a oferta é muito curta para os níveis altos da procura. Quem tem maior poder aquisitivo, está disposto a pagar mais caro por aquilo que existe. Para contrariar esta tendência, temos que ter maior oferta para que os preços possam baixar. É elementar!

A construção é, atualmente, suficiente para responder a essas solicitações?

Nos últimos anos, Braga tem sido uma das cidades onde mais se constrói e se reabilita. Contudo, com o crescimento da população é fundamental criarmos mais casas para as pessoas que procuram a cidade. A revisão do PDM será, com certeza, muito importante para dar resposta a todas estas solicitações e para alavancar ainda mais o mercado de habitação.

Como certifica a qualidade de construção existente no concelho de Braga?

Hoje em dia, a procura é mais exigente. Por outro lado, há uma série de exigências legais impostas pelo estado central e autarquias, através da fiscalização e das vistorias da construção, que obriga ao cumprimento de determinadas regras que há uns anos não eram respeitadas, porque também não eram exigidas. A juntar a este quadro legal de imposições qualitativas da construção, há também vontade e necessidade das pessoas e das empresas de construção em cumprir todas estas normas, melhorando, obviamente, a qualidade da habitação. E esta realidade tem aumentado a “olhos vistos”. Aquilo que se constrói atualmente é manifestamente superior ao que se construía há uns anos atrás, tanto ao nível da construção nova como em termos de reabilitação. E, neste último caso, basta ir ao centro histórico da cidade para comprovarmos isso mesmo.

«A requalificação urbana do centro histórico é um trabalho que continua a ser feito e que só terminará quando atingirmos a reabilitação plena»

Que tipo de apoios a autarquia disponibiliza a quem pretende viver no concelho?

Para além dos apoios tradicionais que são disponibilizados em termos de habitação social, através da BragaHabit, existem uma série de políticas e iniciativas que têm promovido este crescimento gradual. Em primeiro lugar, os incentivos para a reabilitação urbana, tanto no centro histórico como noutras áreas da cidade, desde incentivos fiscais, redução de IVA em materiais ou serviços prestados, entre outros. Estamos também a trabalhar em novas políticas de habitação, como o financiamento ao abrigo do “1.º Direito”, um programa nacional de apoio ao acesso à habitação, e em novas formas de desenvolver o mercado de arrendamento, através de preços controlados. Neste ponto, volto a reforçar que os privados têm um papel importante, porque as entidades públicas não conseguem, sozinhas, promover este mercado de forma sustentada. Tem de existir uma parceria entre Câmara Municipal e os promotores imobiliários privados. E a revisão do PDM poderá também promover que algumas zonas do território possam beneficiar de determinadas características e benefícios para quem nelas queira construir e promover a habitação.

«Não é expectável que uma cidade como Braga tenha determinados agregados familiares sem qualquer condição, conforto e qualidade de vida na sua própria habitação. E, obviamente, teremos de dar resposta a estes problemas»

Como falou, a requalificação da habitação no centro histórico tem sido uma das principais bandeiras deste executivo. Como está esta realidade?

O edificado privado existente no centro histórico está a ser alvo de uma total reabilitação. São raros os prédios que ainda não sofreram processos de reabilitação e há muitos projetos, em apreciação, a aguardar “luz verde”. É um trabalho que continua a ser feito e que só terminará quando atingirmos a reabilitação plena do centro histórico de Braga.

Que vantagens poderá tirar o pelouro da Habitação dos fundos resultantes do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR)?

Alguns programas já existentes podem beneficiar ou não com o PRR. Estamos a acompanhar os desenvolvimentos nesta matéria, não é algo que esteja fechado, mas estamos certos que há determinadas matérias e projetos que temos em vista no futuro, nomeadamente a aposta na construção ambientalmente sustentável. É algo para o qual estamos a olhar com muito cuidado para que possamos recorrer a esse tipo de fundos de forma mais garantida.

Carlos Videira será o novo administrador executivo da BragaHabit substituindo no cargo Vítor Esperança. Quais os motivos para esta escolha?

Fico muito satisfeito que seja uma pessoa jovem. Apesar de estar no início da sua carreira profissional, tem já uma experiência importante nas áreas dos Apoios Sociais e Ação Social. Espero que corra bem, é uma pessoa com a qual vou trabalhar muito nos próximos quatro anos, até porque eu próprio irei também integrar os órgãos sociais, como   presidente do Conselho de Administração, mas sem funções executivas. Irei estar atento a tudo aquilo que se passa na BragaHabit, assim como o município, uma vez que a BragaHabit é uma empresa ligada à área da habitação, detida pelo município, não só do ponto de vista formal, mas também material e que se reflete na atividade da própria empresa. Agora, é “arregaçar as mangas” e continuar o trabalho que foi iniciado pela anterior administração e pelo anterior administrador Victor Esperança, ao longo de 8 anos, para que a BragaHabit continue a cumprir cada vez melhor o seu papel.

Que novidades podemos esperar com esta entrada?

Ainda estamos numa fase inicial e o novo administrador precisa, numa primeira fase, perceber como a BragaHabit trabalha, de facto, no dia a dia. Depois, é identificar os principais problemas existentes, as oportunidades e as vontades também do próprio município relativamente a várias matérias. Posteriormente, o trabalho virá e vai, com certeza, correr bem!

Em termos de política de habitação social, quais os principais problemas que aponta na cidade?

Através da estratégia local de habitação, percebemos que há ainda um número elevado de pessoas que não têm o mínimo de condições de habitação condigna. Não é expectável que um país como o nosso e uma cidade como Braga tenha determinados agregados familiares sem qualquer condição, conforto e qualidade de vida na sua própria habitação. E, obviamente, teremos de dar resposta a estes problemas. É um trabalho que a BragaHabit já tem vindo a fazer, através da gestão de mais de 500 fogos que são propriedade do município, para além do apoio prestado no arrendamento a cerca de 200 fogos. Para além do apoio no âmbito do programa “1.º Direito” e de outras medidas que visam apoiar estas casos de habitação social. Não posso deixar de louvar as obras efetuadas nos bairros sociais de Braga, nomeadamente, nas Enguardas e em Santa Tecla – esta ainda não terminada, intervenções que permitiram dotar estas áreas com os equipamentos necessários e fundamentais para melhorar as condições de vida de muitas pessoas.

Mas ainda há muitas carências graves e preocupantes?

Sim, obviamente originárias de diferentes contextos. Mas o número é suficientemente elevado e preocupante para estarmos atentos e trabalharmos afincadamente, no sentido de terminarmos com essa realidade em Braga.

Braga é uma das nove cidades europeias que integram o projeto ROOF – Ending Homelessness que visa promover a integração das pessoas em situação de sem-abrigo, através de soluções habitacionais inovadoras de âmbito local. O que nos pode dizer sobre este projeto?

É um projeto importante, tal como outros, para a integração de pessoas que não têm casa para viver. Nesta matéria, tem-se feito muito e devemos continuar a fazer este trabalho. E não devemos olhar só para as entidades públicas como as únicas soluções. O trabalho do terceiro setor e de algumas entidades privadas com comprometimento e responsabilidade social é também fundamental. Os serviços do município têm feito um acompanhamento muito particular destas situações, e tudo faremos para que este flagelo seja cada vez menor, conseguindo retirar as pessoas sem-abrigo das ruas e dando-lhes a possibilidade de ter uma vida normal, digna e saudável.

Quais são os grandes desafios e metas para os próximos anos, do pelouro de Habitação do município de Braga?

Os grandes desafios englobam não só o pelouro de Habitação, mas também o Urbanismo, Planeamento e Regeneração Urbana. Não podemos dissociar uma das outras. Tem de existir sempre uma conjugação entre todas e não podem ser trabalhadas de forma eficiente se estiverem isoladas. A questão do PDM , como já falei anteriormente, será relevante para a resolução de muitos problemas resultantes da Habitação. Daremos também muito foco à apreciação urbanística e à forma como os procedimentos são ou não apreciados e aprovados. E, depois, a questão da reabilitação urbana. Há ainda muitos fogos em Braga que carecem de reabilitação e que podem ser excelentes alternativas para quem necessite de habitação, e que hoje em dia, não tem possibilidade de recorrer, devido ao elevado preço do mercado de arrendamento.

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